segunda-feira, 13 de junho de 2011

Entrevista com Heraldo da Costa Reis

Membro do corpo técnico do IBAM há 40 anos, Heraldo da Costa Reis, coautor do livro "A Lei 4.320 Comentada" e responsável por suas atualizações, fala sobre a gestão pública, defende a adoção do princípio contábil da competência e comenta dúvidas de caráter orçamentário, financeiro e patrimonial que esclarece no seu dia a dia no Instituto.
O senhor trabalha há muitos anos no IBAM e com a área pública. Como o senhor enxerga a gestão das entidades públicas em todo este período? Quais foram as mudanças significativas?
Penso que a gestão pública, em todas esferas governamentais, procura cumprir de forma correta com as suas finalidades junto aos cidadãos, em que pese as dificuldades encontradas, tais como a falta de recursos financeiros e de outras naturezas.
As mudanças significativas estão se evidenciando:
  1. na conscientização do cidadão da necessidade de participar efetivamente da gestão, exigindo do gestor mais responsabilidade no exercício das funções que lhes pertinem;
  2. na melhor qualificação dos nossos gestores que se conscientizaram de que antes de serem políticos gestores são cidadãos, e, como tais, beneficiam-se das consequências dos atos que praticam;
  3. na melhor qualificação dos servidores que auxiliam os gestores principais no cumprimento das suas responsabilidades.
Em seu artigo Regime de caixa ou de competência: eis a questão, o senhor defende que as contabilidades das organizações governamentais deveriam utilizar o princípio contábil da competência financeira para o reconhecimento das respectivas receitas e despesas. Quais os impactos que essa adoção poderia trazer para gestão dessas entidades? E quais os procedimentos necessários para a adoção deste princípio?
Preliminarmente, esclareço a utilização da expressão competência financeira no artigo Regime de Caixa ou de Competência: eis a questão, para diferenciá-la da expressão competência orçamentária utilizada atualmente pelas contabilidades governamentais no reconhecimento das despesas orçamentárias, em razão do que dispõe o art. 35, II, da Lei 4320, de 17 de março de 1964.
A utilização efetiva do princípio contábil da competência melhoraria a qualidade da informação gerada pela Contabilidade, tão prejudicada em razão de interpretação equivocada da legislação que orienta os procedimentos contábeis, e evitaria o surgimento de contas como Restos a Pagar Não Processados, que distorce o conteúdo informativo das demonstrações preparadas pela Contabilidade.
Demais disso, a Lei 4320, bem como a recente LC 101/2000, nunca foram entendidas como as que têm relações com os dispositivos de Leis como as de nº 5172/1966, 8666/93 e. até mesmo, de anteriores.
Bem, muito mais importante é entender que a adoção do Princípio da Competência muda completamente o sentido das informações sobre a situação econômico-financeira da entidade, pois revela uma situação um tanto obscura como a que se relaciona com os devedores da fazenda pública, não apenas os que se encontram em cobrança amigável, como aqueles que estão em cobrança judicial, posto que nunca foram revelados.
A todo o instante lemos nos jornais discussões sobre o quanto gasta o Poder Público com as chamadas despesas de custeio, e dentre estas as que se destinam a despesas de pessoal, ou o quanto o Poder Público deveria aplicar em Investimentos, como se estes não provocassem o aparecimento daquelas. Mas, nunca ouvi ou li qualquer coisa sobre o quanto gasta o Poder Público para gerar e manter benefícios em favor daqueles que continuam devendo à Fazenda Pública. O que quero afirmar é que o procedimento que se propõe muda o foco do controle para os devedores, fazendo com o que os créditos em cobrança sejam revelados no início e no fim do período, e pressione a administração para a sua efetiva cobrança.
Para que isto aconteça, entretanto, há a necessidade de uma mudança de cultura na nossa administração em todos os setores, inclusive nos procedimentos administrativos, os quais envolvem a organização administrativa e contábil, o que inclui a qualificação dos servidores (ver artigo de minha autoria Razões e Condições para adoção do Regime de Competência na Contabilidade Governamental).
Atualmente, a Contabilidade tem relações mais estreitas com a Tesouraria, em razão do regime de caixa, em que as receitas são reconhecidas. Com a adoção do regime de competência essa situação muda completamente, pois a Contabilidade conversará primeiro com o setor da receita para tomar conhecimento inicial dos devedores para, posteriormente, proceder aos registros das arrecadações, por isto as necessárias reformulações administrativas, o que não significa que se abandonará as informações da Tesouraria, as quais servirão de base para as avaliações dos saldos finais dos créditos a receber.
O senhor afirma que a adoção do chamado Regime Misto decorre de uma interpretação equivocada e isolada dos dispositivos que tratam das Normas Gerais de Direito Financeiro, em destaque a Lei Federal 4.320/64. Sendo o senhor professor de Ciências Contábeis, que tipo de cuidados devem ser observados por parte dos contadores, gestores e outras pessoas envolvidas no processo de tomada de decisão para que não interpretem a legislação dessa forma?
Penso que o primeiro passo é ler o conteúdo da Lei com cuidado, com atenção, identificar as ligações que os dispositivos têm entre si e com outras leis. A legislação na área governamental é complexa, a começar da própria Constituição da República, daí o necessário cuidado na leitura para evitar, ou, pelo menos, minimizar os equívocos.
Dentro da área pública é difícil observar preocupações com determinados aspectos muito comuns no mercado, como por exemplo, a depreciação e o controle dos custos das atividades realizadas. O senhor, através de artigos que escreveu, defende a apuração dos custos das atividades realizadas pela entidade pública assim como a depreciação a que estão sujeitos os bens públicos. Por quê?
São assuntos que estão emergindo agora com a adoção de novos procedimentos contábeis motivados pelas Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público, e que, entretanto, não são tão novos assim, como se vem propalando.
Há muito tempo, desde a primeira edição do meu livro Contabilidade Muncipal, teoria e prática (1973), venho falando sobre os mesmos. A própria Lei 4320, que já tem 47 (quarenta e sete) anos trata desses assuntos. Só que, como muitas outras regras, nunca foram postas em prática. Porque razão? Não sei.
No IBAM, o senhor trabalha com consultoria há muitos anos. O senhor poderia elencar algumas das dúvidas mais frequentes demandadas pelos Municípios. A questão da contabilização dos bens públicos de uso comum como ativos públicos, da qual o senhor discorda, é uma delas? O senhor poderia explicar melhor as razões de sua discordância?
Além das atividades de Professor e Coordenador dos Cursos nas áreas de Orçamento, Contabilidade e Finanças Governamentais, promovidos pela Escola Nacional de Serviços Urbanos do IBAM, todas as dúvidas específicas de caráter orçamentário, financeiro e patrimonial, apresentadas por escrito e por telefone pelas entidades municipais associadas ao Instituto, são atendidas por meio de pronunciamentos técnicos, de acordo com a natureza da consulta, pelo setor que está sob a minha responsabilidade denominado Centro de Estudos Interdisciplinares em Finanças Municipais – CEIF.
São dúvidas apresentadas pelos Poderes Executivo e Legislativo, que nos obrigam a estudos e pesquisas naqueles campos para a elaboração do respectivo pronunciamento. Abro um parênteses para informar que, às vezes, a título de cortesia, atendo também os mesmos problemas que me são apresentados por entidades governamentais que não estão associadas ao IBAM.
Além dos pronunciamentos técnicos, que às vezes são utilizados pela Justiça nos seus julgados, o CEIF realiza outros trabalhos de índole técnica sob a forma de projetos tais como análises de balanços, de orçamentos, da Lei de Diretrizes Orçamentárias, e do Plano Plurianual, bem como de Leis que criam os Fundos Especiais. Sobre cada tema, também é emitido um pronunciamento de natureza técnica, com recomendações para procedimentos de ajustes e correção.
Com referência aos bens de uso comum tais como ruas, praças, parques, jardins, avenidas, pontes, rodovias, pontilhões, túneis e outros do gênero, a minha opinião é de que as aplicações de recursos sejam contabilizadas na fase de construção para se apurar os respectivos custos. A ativação desses bens após a construção, no meu entendimento, é desnecessária por se tratar de benefícios gerados em favor da população.
É preciso que se entenda que esses benefícios às vezes são de natureza tangível ou intangível como, por exemplo, o aprendizado (na área da educação), a saúde, extinção de doenças e outros. As ruas, as praças, os jardins, as pontes, os túneis, as rodovias, os viadutos, os monumentos nas praças, são da população, que os utiliza para a sua satisfação. São, portanto, diferentes daqueles bens utilizados pela Administração para a concretização das finalidades da organização governamental, em que pese alguns poderem ser classificados como de uso comum.
O senhor acredita que o orçamento participativo é uma boa ação para democratizar o acesso da sociedade civil às decisões sobre como gastar o dinheiro público? De que forma esse processo ocorre nas experiências brasileiras?
Só acredito quando o cidadão se conscientizar de que, além dos direitos que reivindica, tem obrigações e deveres para cumprir. Portanto, o orçamento participativo deve ser um instrumento de mão dupla.
O senhor é um dos poucos profissionais da área pública que possui reconhecimento tanto dentro da academia quanto no mercado. De que maneira o senhor acredita que uma atividade pode auxiliar na boa execução da outra e vice-versa?
Se sou reconhecido, não sei, mas tenho me esforçado para dar a minha contribuição como cidadão e como profissional.
Penso que haver integração das atividades da organização, não importa se é meio ou fim, leva ao sucesso na concretização dos seus objetivos.

Fonte: http://www.ibam.org.br/noticia/56

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Evolução patrimonial

Paulo Caetano - Presidente do CRC-PR
Enriquecer pelas vias aceitáveis não é crime. Melhorar o padrão de
vida é a luta diária de todos que empreendem, trabalham, estudam, suam a
camisa. O próprio Estado brasileiro só justifica a sua existência pela
missão de promover o enriquecimento da nação, a expansão do Produto Interno
Bruto e a renda das famílias.

É comemorativo que a nossa classe C está crescendo. O segmento, que
inclui famílias com ganhos mensais de quatro a dez salários mínimos, já soma
a metade da população. Até famílias paupérrimas vêm tendo chances de sair do
estado de pobreza, embora agarrando-se a um programa social, o Bolsa
Família.

Estatísticas apontam algumas linhas de evolução financeira: entre 2003
e 2009, a renda individual da população saltou 3,8% ao ano, a renda média do
trabalhador 7,6% e a dos funcionários públicos teve valorização de 11,20%
entre 2002 e 2008; no mesmo período, o salário mínimo teve aumento real de
37% passando de R$ 303 para R$ 415.

Uma realidade camuflada pelos números é a concentração das riquezas,
ainda preocupante e um desafio a ser vencido. Mas nada impede que pessoas, a
exemplo do empresário Eike Batista, multipliquem suas fortunas. De acordo
com a revista "Forbes", já temos pelo menos 30 bilionários que, juntos,
detêm R$ 216 bilhões. Entre os novos bilionários está o jovem brasileiro
naturalizado americano Eduardo Saverin, co-fundadar do Facebook: com 5% da
empresa, seu patrimônio é avaliado em US$ 2,5 bilhões. Já os brasileiros
milionários podem chegar a 150 mil, segundo a Associação Brasileira das
Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).

Certos livros tentam vender a ideia de que é fácil enriquecer, mas os
principais fatores são mesmo suor, trabalho, educação e capacidade de
empreender. Estamos avançando na esteira do crescimento nacional. Os mais
ricos vão mais velozmente porque dinheiro chama dinheiro. É assim que
funciona no campo da livre iniciativa, onde também entram a sorte e outros
fatores imprevisíveis, como o que contemplou Eduardo Saverin, ganhar um
megaprêmio...

Já, certas evoluções patrimoniais não têm explicação. São injustificáveis, ilegais e imorais. Pode não ser o caso de Antônio Palocci,
mas é bem o de muita gente, que atua na vida pública, no Brasil, cujos bens
aumentam de forma espantosa. Se a empresa do ministro da Casa Civil Projeto
Con­sultoria Financeira e Econômica Ltda não fez nada errado e ele
multiplicou em 20 vezes seu patrimônio entre 2006 e 2010, de forma justa,
então por que a reticência em dar satisfações, a ponto de esconder-se atrás
da presidente Dilma e do ex-presidente Lula?

O “milagre” de certos enriquecimentos em nosso país é a relação
promíscua entre público e privado.

Isso é crime.



Contador, empresário da contabilidade e presidente do CRCPR; e-mail:
pcaetano@pcaetano.com.br


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quinta-feira, 2 de junho de 2011

Simples amplia arrecadação de estados e municípios

Presidente do Sebrae, Luiz Barretto, diz que aumento, porém, não implicou em mais impostos para o cidadão
Dilma Tavares
Brasília - O Simples Nacional, sistema especial de tributação de micro e pequenas empresas, mostra que é possível ampliar a arrecadação de estados e municípios sem aumentar os impostos. Essa é a avaliação do presidente do Sebrae, Luiz Barretto, ao comentar a marca de 5 milhões de empresas que já aderiram ao regime.
“O Simples mostra que é possível aumentar a arrecadação dos governos sem aumentar a carga tributária para o cidadão e ainda beneficiar as micro e pequenas empresas. A arrecadação é crescente: em 2010, foram R$ 2,5 bilhões do ISS para os municípios, um salto de 365% em relação a 2007, e o crescimento do ICMS para os estados foi de 253%, chegando a R$ 6,2 bilhões em 2010. O Simples é uma vitória para todos nós”, afirma Barretto.
O regime de tributação alcançou a marca de 5 milhões de micro e pequenas empresas no último domingo (29), segundo o Comitê Gestor do Simples Nacional (CGSN). O número representa 83,7% do total das 5.972.474 micro e pequenas empresas do país e 83% das 6.026.413 de todas as empresas que existem no território nacional.
O Simples Nacional, mais conhecido como Supersimples, é o sistema especial de tributação das micro e pequenas empresas, criado pela Lei Geral da Micro e Pequena Empresa (Lei complementar 123/06). Ele unifica a cobrança de seis tributos federais (IRPJ, IPI, PIS,COFINS, CSLL, INSS patronal) mais o ICMS estadual e o ISS municipal. Podem optar por recolher tributos por esse sistema as empresas com receita bruta de até R$ 2,4 milhões por ano.

O sistema entrou em vigor em julho de 2007, substituindo o antigo Simples Federal. Na época, migraram automaticamente para o novo regime 1,3 milhão de empresas. “Desde então o número de optantes não parou de crescer”, afirma o secretário executivo do comitê, Silas Santiago.
Em 2007, o sistema contava com 2,8 milhões de empresas, passando para 3,1 milhões em 2008, havendo grande impulso nas opções a partir de 2009, com a criação do Empreendedor Individual (EI), programa entrou em vigor em julho de 2009.

Inserido na lei da pequena empresa por meio da Lei Complementar 128/08, o Empreendedor Individual possibilita a formalização de empreendedores por conta própria como pipoqueiros, chaveiros, boleiras e costureiras. Ao se registrar, esses profissionais entram automaticamente no Simples Nacional.

Os números do CGSN mostram que, naquele ano, estavam no sistema 3,4 milhões empresas, das quais 77 mil eram empreendedores individuais. Em 2010, eram 4,5 milhões, sendo 810 mil EI. No último domingo, chegou ao número de 5.010.000. Destas, 1,1 milhão é empreendedor individual.
A opção pelo Simples Nacional é feita sempre em janeiro de cada ano, exceto para as recém registradas, que podem optar a qualquer momento. Números do CGSN mostram índice crescente de empresas novas entrando no sistema, mesmo com a criação do Empreendedor Individual. Em 2007, foram 266.725, em 2008, 340.643, em 2009, 406.108, e em 2010 foram 418.873 empresas. Em 2011 já são 129.775.

Serviço
Agência Sebrae de Notícias: (61) 3243-7851 / 3243-7852 / 9977-9529
Fonte:http://www.agenciasebrae.com.br/noticias/politicas-publicas/
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País recebeu US$ 5,6 bilhões

O fluxo cambial em maio, até o dia 27, foi positivo em US$ 5,626 bilhões, de acordo com dados divulgados hoje pelo Banco Central (BC). O resultado foi determinado basicamente pelo forte desempenho do segmento comercial, no qual as exportações superaram as importações em US$ 6,082 bilhões - quase o dobro de todo mês de abril e o maior volume para um mês (ainda que com dados parciais) desde setembro de 2008. As exportações no mês passado até o dia 27 somaram US$ 21,855 bilhões e as importações, US$ 15,774 bilhões.

No segmento financeiro, o fluxo no mês aponta saldo negativo de US$ 456 milhões, resultado de entradas de US$ 28,316 bilhões e saídas de US$ 28,772 bilhões. O Banco Central informou ainda que as compras de dólares elevaram as reservas internacionais do País em maio, até o dia 27, em US$ 4,165 bilhões.
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terça-feira, 17 de maio de 2011

INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE - IMPOSSIBILIDADE DE ACUMULAÇÃO DOS ADICIONAIS


Sergio Ferreira Pantaleão
A legislação trabalhista protege, por meio de normas, todo trabalhador que executa suas funções em atividades insalubres ou perigosas, de forma a amenizar o impacto destas atividades na saúde do trabalhador.
São periculosas as atividades ou operações onde a natureza ou os seus métodos de trabalhos configure um contato com substancias inflamáveis ou explosivos, em condição de risco acentuada, como é o caso, por exemplo, de frentista de posto de combustível, operador em distribuidora de gás, entre outros.
São consideradas atividades ou operações insalubres as que se desenvolvem acima dos limites de tolerância previstos nos anexos à NR-15.
O art. 189 e 193 da CLT assim definem estas atividades:
  • Consideram-se atividades ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos;
  • Consideram-se atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem o contato permanente com inflamáveis ou explosivos em condições de risco acentuado.
É facultado às empresas e aos sindicatos das categorias profissionais interessadas, requererem ao Ministério do Trabalho a realização de perícia em estabelecimento ou setor específico, com o objetivo de caracterizar e classificar ou delimitar as atividades insalubres ou perigosas.

Nas perícias requeridas às Delegacias Regionais do Trabalho, uma vez comprovada a insalubridade, o perito do Ministério do Trabalho indicará o adicional devido, podendo ser, conforme art. 192 da CLT, de 10%, 20% ou de 40%.

Por sua vez, conforme dispõe o § 1º do art. 193 da CLT, o trabalho realizado em ambientes periculosos assegura ao empregado um adicional de 30% (trinta por cento) sobre o salário sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa.

Caso, por meio de perícia, se constate que a atividade exercida seja, concomitantemente, insalubre e perigosa, será facultado aos empregados que estão sujeitos à estas condições, optar pelo adicional que lhe for mais favorável, não podendo perceber, cumulativamente, ambos os adicionais.

Portanto, se em determinada atividade o perito indicar que há insalubridade em grau médio (20%) e periculosidade (30%), o empregado não terá direito a perceber, cumulativamente, (50%) de adicional, já que a legislação trabalhista faculta ao empregado o direito de optar pelo mais favorável, ou seja, o de periculosidade.

Esta opção, embora pareça ser óbvia quanto ao mais favorável (analisando os percentuais), não espelha a verdade quando analisamos a base de cálculo para a apuração do referido adicional.

É o caso, por exemplo, de se dizer que o empregado que exerça a  atividade em que há, simultaneamente, a insalubridade em grau máximo (40%) e a periculosidade, opte pelo adicional de insalubridade, por ter um percentual maior.

Considerando que a base de cálculo do adicional de insalubridade (frente a toda controvérsia gerada pela súmula vinculante nº 4 do STF) ainda é o salário mínimo, salvo disposição em contrário prevista em acordo ou convenção coletiva, e que a base de cálculo do adicional de periculosidade é o salário do empregado, a condição mais favorável poderá ser o de periculosidade, caso o salário do trabalhador seja consideravelmente superior ao salário mínimo.

Sergio Ferreira Pantaleão é Advogado, Administrador, responsável técnico pelo Guia Trabalhista e autor de obras na área trabalhista e Previdenciária.
Fonte: http://www.guiatrabalhista.com.br/tematicas/insalubre_perigoso.htm

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segunda-feira, 16 de maio de 2011

SISTEMAS DE GESTÃO: SÃO NECESSÁRIOS AO JUDICIÁRIO?

Mauriti Maranhão - Mestre em ciências, engenheiro e estatístico. Consultor da equipe da FGV Projetos no Projeto de Modernização e Gestão do Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro.

Persio Arida, Edmar Bacha Lisboa e André Lara Resende[1], os formuladores do Plano Real, definem incerteza jurisdicional como "distorção de natureza institucional que impede a existência de um mercado de crédito de longo prazo no país, bem como a queda da taxa de juros para níveis internacionais".

Ao analisar o impacto das instituições sobre a economia brasileira, o economista Vinod Thomas[2] definiu: "Governança é um termo amplo e abrange todos os modos de exercício da autoridade visando o bem comum. A governança é composta por diversos elementos - participação, responsabilidade, oferta de serviços, marco regulatório, Estado de direito e controle da corrupção" e comenta que o Judiciário é o principal ator das atuais falhas de governança no País.

O mesmo autor afirma que "A proteção ao cumprimento de contratos também é mais deficiente no Brasil. São necessários 16 procedimentos e 380 dias para solucionar uma disputa contratual, comparado a 15 procedimentos e 210 dias em Taiwan, e 16 procedimentos em 183 dias na Irlanda. Um tempo menor para judicialmente executar um contrato permite que as firmas operem com maior flexibilidade, facilitando, por exemplo, as subcobtratações em Taiwan, o que possibilita às grandes companhias repassar trabalhos para as micro e pequenas empresas".

Com base nesses dois relatos, e em várias outras fontes confiáveis, a incerteza jurisdicional tem sido apontada como um dos grandes entraves ao desenvolvimento do País. De forma simplista, a incerteza juridicional, tal como definida, denota ser conseqüência  de dois grandes conjuntos de causas: a legislação vigente, analisada no artigo dos formuladores do Plano Real e a gestão no Judiciário. Alguns magistrados atribuem, em ordem de grandeza, metade de responsabilidade para cada um desses conjuntos causais.

Este artigo, diz respeito à metade (quem sabe, a "metade maior") das causas da incerteza jurisdicional no país, aquela epecificamente decorrente da forma mais usual de gestão praticada no Judiciário. Seria injusto não reconhecer os ingentes esforços de alguns setores, que têm conseguido expressivos avanços, com a adoção de práticas mais atuais de gestão. Os líderes que os conduzem têm todos os méritos e a coragem pertinentes aos desbravadores, transformando ou quebrando paradigmas seculares, muitos deles herdados da intrincada burocracia portuguesa do século XIX[3].

Com base nos indicadores nacionais disponíveis, ainda incipientes, não se pode deixar de reconhecer que a situação geral da gestão no Judiciário apresenta-se como questionável, a requerer transformações  urgentes, profundas e abrangentes. 

A intenção do autor é submeter à reflexão de magistrados e servidores do Judiciário, bem como da sociedade em geral, com humildade e sincero propósito, um caminho que pode trazer benefícios à redução da incerteza jurisdicional supra-comentada.

Dos primeiros, magistrados e servidores, espera-se perseverança na adoção de métodos de gestão organizados segundo sistemas de gestão em suas respectivas unidades organizacionais, com o fim de prover aos executores as referências documentais para a realização adequada de suas atribuições, daí decorrendo a desejada satisfação dos usuários.

Da sociedade espera-se o estabelecimento e o aprimorarmento contínuo, em termos firmes mas apropriados, de exigência por prestação jurisdicional eficaz e eficiente, no pressuposto de que o resultado de uma atividade é conseqüência direta do grau de exigência do respectivo usuário, o fiscal; é dessa relação - (qualidade de entrega do serviço) / (grau de exigência) - que se cristalizam a longo prazo círculos virtuosos ou círculos viciosos, este último quando o grau de exigência do usuário é baixo.

Diante da grande exposição do Judiciário na mídia, nem sempre com citações edificantes e, não raro, injustas[4], cabe formular uma pergunta:

Qual é a prioridade em prover sistemas de gestão
nas unidades organizacionais do Judiciário, jurisdicionais ou administrativas?

À primeira vista, poder-se-ia pensar que, em face de tantas questões urgentes e importantes presentes no dia-a-dia, tanto de unidades jurisdicionais quanto de apoio administrativo, alocar energia sob o tema sistemas de gestão poderia representar falta de foco, desperdício ou sonho de teóricos. Alguns têm dito que se trata de loucura, modernismos e, acredite-se, coisa do FMI e do Banco Muncial. Lamentavelmente, a expressão sistemas de gestão ainda constitui expressão abstrata, árida e fluida para a grande maioria de magistrados e servidores do Judiciário.

Todavia, sob um ponto de vista mais cuidadoso, muito provavelmente a questão colocada não tem uma resposta tão trivial; muito provavelmente, a resposta pode mostrar-se  surpreendente, em face do desconhecimento de prática tão indispensável à gestão pública.

Para tentar responder à questão apresentada, veja-se inicialmente o que significa sistema de gestão para os não-iniciados. De forma simples, pode ser conceituada como um "conjunto de elementos para dirigir e controlar uma organização". Nesse caso, dirigir tem o sentido de conduzir a organização, todavia sem qualificar o resultado obtido; a direção pode ser, in extremis, competente ou desastrosa. Similarmente, controlar tem o sentido de, mediante a disponibilidade de informações adequadas ou indicadores, conduzir a organização conscientemente a um rumo desejado e previamente planejado.

Voltando à questão formulada - conveniência e oportunidade de sistema de gestão no Judiciário -, cabe questionar se as dificuldades enfrentadas hoje pelo Judiciário são inevitáveis ou, como aqui procura se mostrar, se são apenas conseqüências de falhas na gestão, decorrentes da ausência de utilização de sistemas de gestão como método racional.

É bastante comum o aforismo "prevenir é melhor que remediar". A sabedoria popular traduz um dos elementos básicos de sistemas de gestão, a necessidade de planejamento[5]. Em outras palavras, é sempre melhor e muito mais barato planejar do que consertar os erros decorrentes. O conceito de planejar implica o entendimento da escolha correta entre "pensar antes de agir" e "agir antes de pensar". Em sentido amplo, essa escolha pode decidir entre o desenvolvimento e o atraso: organizações desenvolvidas planejam antes de agir; organizações atrasadas agem antes de pensar. Essas, paradoxalmente, uma vez que têm poucos recursos, pagam um preço elevado pela má escolha; resta-lhes, como alternativa mais provável, manterem-se atrasadas, em face de não disporem de recursos para fazer investimentos. A experiência mostra que a "natureza é pródiga, mas não faz concessões": a colheita reflete a qualidade da plantação.

Exemplifica-se com uma das inúmeras possibilidades concretas que o Judiciário nos oferece para avaliar o impacto de empregar ou não sistemas de gestão. Fixemo-nos no começo de tudo: o equilíbrio entre a oferta e a demanda da jurisdição, representada pela distribuição de casos novos.

Quando um tribunal planeja a sua demanda[6], é capaz de preparar-se para atendê-la, com a tranqüilidade que a antecedência de planejamento lhe permitir. Ressalvadas condições extraordinárias, em princípio terá condições de melhor se organizar, aquele que melhor se planejar. Caso haja indícios fortes de crescimento da demanda, há que se prever, pelo menos:
·         contratação, formação e capacitação da equipe (magistrados e servidores);
·         tempo e recursos para a construção ou a locação de instalações de novas serventias;
·         demais recursos (computadores, sistemas, rede de dados, materiais etc.).

Com isso torna-se possível evitar ou limitar o congestionamento de ações no Judiciário, condição que de outra forma dificilmente deixará de ocorrer, como conseqüência da dificuldade de enfrentar, sem as ferramentas apropriadas, o inevitável acúmulo de processos.

Muitos poderão dizer que essa forma de trabalhar somente seria viabilizada com a disponibilidade de recursos, em geral inexistentes naquele momento. Todavia, é razoável dizer que também a disponibilidade de recursos será proporcional à capacidade de planejamento da organização. Não é raro uma organização aplicar recursos com extrema ineficiência ao final de exercícios, em face da possibilidade de ter reduzidas parcelas de orçamento não-executado, decorrente da fragilidade de planejar as necessidades. Mais uma vez se aplica a máxima "é melhor prever do que remediar".

Analisemos uma das conseqüências da baixa capacidade de planejar no Judiciário, condição que se tem mostrado recorrente: quanto o referido congestionamento, anteriormente mencionado, custará para o jurisdicionado, para o Judiciário e para a sociedade?

Além dos custos diretos, que trazem enorme impacto negativo tanto para a economia quanto para o bem-estar da sociedade, há que se considerar os custos de oportunidade. Estes são custos, em geral escondidos, decorrentes da impossibilidade de realizar outras coisas, em face da falta de solução aos conflitos represados.

Um dos mais expressivos custos de oportunidade refere-se às conseqüências da incerteza jurisdicional, anteriormente mencionada.  

Em que medida a implementação de sistemas de gestão poderia contribuir para melhorar esses e outros resultados do Judiciário? Antes de tentar responder a essa questão, façamos uma síntese do que são e para que servem ao Judiciário os sistemas de gestão.

Com o fim de facilitar a compreensão do assunto, apresentemos as bases de um sistema de gestão, desdobrado nos seus cinco elementos-chave:


ELEMENTO (*)
FINALIDADE
1. Alicerce ou esqueleto
·   esclarecer e documentar a visão de conjunto, o arcabouço da gestão;
·   estabelecer as fronteiras ou a abrangência do sistema, bem como os cuidados essenciais com a documentação (controle de documentos e de registros).
2. Estratégia, responsabilidade, autoridade e comunicação
·   estabelecer as intenções de futuro da organização (política, objetivos, indicadores e metas de natureza`estratégica);
·   estabelecer as relações de poder e de autoridade;
·   estabelecer o processo de comunicação interna;
·   estabelecer o arranjo de decisões.
3. Recursos
·   prever a capacitação das pessoas, necessidades de instalações, equipamentos, ferramentas e ambiente de trabalho.
4. Transformações
·   pormenorizar a forma de execução das atividades (processos de trabalho);
·   definir as interfaces entre as atividades;
·   documentar o que for essencial.
5. Medição, análise e melhorias
·   obter os números que representam os resultados de todas as atividades;
·   realizar as análise decorrentes e prepará-las para a tomada de decisão consistente.

(*) Esses elementos constituem-se em síntese dos requisitos estabelecidos, respectivamente, nos capítulos 4, 5, 6, 7 e 8 da NBR ISO 9001:2000.

Adequadamente implementada, essa estruturação permitirá ao gestor planejar suas ações e ter domínio sobre a execução do respectivo planejamento. O domínio é obtido mediante os indicadores de pontos críticos dos processos de trabalho (os "gargalos"), habilitando-o a tomar as melhores decisões.

O modelo apresentado para sistemas de gestão tem base na norma internacional NBR ISO 9001:2000. Foi aqui escolhido em face de ter aceitação universal (praticamente todas as economias do mundo)[7], está substancialmente experimentado (mais de 600.000 certificados emitidos), é simples, consistente e completo. Há outros modelos para  sistemas de gestão; todavia, por uma questão de racionalidade, todos possuirão a mesma base do modelo ISO.

O modelo de pilotagem de aviões pode ser uma analogia simples à gestão de qualquer organização, inclusive daquelas do Judiciário. O piloto de um avião necessita ter um bom alicerce de trabalho (o manual do avião), tem a sua estratégia definida (o seu plano de vôo), os recursos (o avião, a equipe, os sistemas), as transformações (diferentes rotinas de vôo, combustível, comunicação etc.) e os indicadores (instrumentos de bordo). Gerindo adequadamente o seu sistema de gestão, o piloto tem boas chances de chegar ao destino na hora planejada (ser eficaz), com segurança e com o mínimo consumo de combustível (ser eficiente).
Apliquemos o exemplo do piloto ao funcionamento de uma Vara qualquer:
  • Alicerce: o Manual de Gestão, Manual da Qualidade ou Documento Estratégico (o nome não é relevante), legislação, jurisprudência, normas etc.;
  • Estratégia, reponsabilidade, autoridade e comunicação: missão, visão, objetivos e metas, organograma e atribuições, método de decisão e de comunicação com a equipe;
  • Recursos: pessoas capacitadas, instalações, computadores, sistemas, serviços indispensáveis etc.;
  • Transformações: métodos estabelecidos para as diferentes atividades realizadas (autuar, processar, atender ao público no balcão etc.);
  • Medição, análise e melhorias: dispor de indicadores necessários e suficientes ao conhecimento preciso do que está acontecendo e que permitam subsidiar a tomada de decisões consistentes.

 Os especialistas em gestão tendem a identificar a generalidade de funcionamento das organizações por sistemas, tal como para os organismos vivos. A figura mostra o conceito de funcionamento dos sistemas.
A essência é que todos os sistemas e organizações têm entradas (petições, no caso de Varas), transformações (processamento e decisões, no caso de Varas), saídas (processo com sentença, no caso de Varas) e retroalimentações (decisões administrativas de gestão necessárias à manutenção do rumo estabelecido pela estratégia, com o fim de atender às necessidades dos usuários).

Gerir unidades do Judiciário com o emprego de sistemas de gestão pode parecer matéria apenas estranha ou teórica para aqueles que ainda não tiveram a feliz oportunidade de observar o sucesso de unidades do Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro incorporadas à certificação ISO 9001:2000[8].

Finaliza-se com a mais recente experiência, a pré-auditoria do IX Juizado Especial Criminal do PJERJ.  É gratificante e encorajador ter ouvido, tanto do Juiz Titular quanto da Escrivã, que estavam sendo auditados, apresentar o pleno conhecimento e controle dos resultados do Juizado, consolidados em planilhas de indicadores de desempenho dos processos de trabalho que mostram a situação atual, a tendência e comparações de cada resultado crítico; os "pilotos" desse Juizado revelaram tanta segurança nos seus trabalhos a ponto de permitir a antecipação da auditoria de certificação, em face da caracterização de que o "sistema de gestão roda".  Tal como mostrado na figura, as coisas, mesmo não sendo perfeitas, evidenciam a direção, o controle e a retroalimentação dos efeitos; enfim, se vislumbra, de forma objetiva, que:
·         as coisas são pensadas (e planejadas) antes de serem executadas;
·         a execução ocorre da forma como foi planejada;
·         as coisas executadas são verificadas, antes de serem entregues aos usuários;
·         existem ações para corrigir os eventuais desvios entre o planejamento e a execução;
·         o funcionamento do sistema de gestão é verificado, com base no respectivo planejamento, por um Órgão Certificador de Terceira Parte, que tem plena independência para emitir o seu parecer.

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[1] Credit, Interest, and Jurisditional Uncertainty: Conjectures on the Case of Brazil - Instituto de Estudos de Política Econômica, Casa das Garças, Rio de Janeiro, Brazil.
[2] O Brasil Visto por Dentro, Vinod Thomas, Editora José Olympio, 2005.
[3] Patrick Wilckens retrata, com simplicidade e rigor, essa complicada herança, relatada no livro Império à Deriva, Ediitora Objetiva, 2005.
[4] O cidadão comum, provido de formação e informação precárias (algumas estatísticas revelam que cerca de 2/3 da população tem  analfabetismo funcional) é incapaz de distinguir a função das instituições responsáveis pelo sistema judicial (delegacias judiciárias, Ministério Público, Judiciário e sistema prisional), verbalizando que a "justiça" no País não funciona.  
[5] O método básico da gestão é o P-D-C-A, as quatro fases de qualquer atividade: planejar (antes de iniciar), executar (o que e como foi planejado), controlar (verificar se o resultado da execução corresponde ao que foi planejado) e atuar corretivamente (corrigir os eventuais desvios entre planejamento e execução).
[6] O texto refer-se à circunstância na qual o planejamento da demanda é decorrente de projeções de série histórica; exclui-se dessa afirmação a demanda, explosiva ou fortuita, gerada por causas novas ou desconhecidas, cujo controle transcende à governabilidade do Judiciário.
[7] Informações pormenorizadas sobre sistemas de gestão NBR ISO 9001:2000 poderão ser obtidas na obra ISO série 9000 - Manual de Implementação. Mauriti Maranhão, Editora Qualitymark, 8a edição, 2006.
[8] Unidades organizacionais cujos sistemas integrados de gestão (SIGA) já receberam a certificação ISO 9001:2000: Escola da Magistratura, 13a Vara Cível, 18a Câmara Cível, 9a, 19a  e 32a Varas Criminais da Comarca da Capital, Departamento Geral de Arquivos, Departamento de Arrecadação do Fundo Especial de Justiça, 12a Vara de Família da Comarca da Capital, IV Juizado Especial Cível e 8a Câmara Criminal. O IX Juizado Especial Criminal será submetido à auditoria de certificação ao final do mês de agosto deste ano.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Venda da folha de pagamento de entidades do setor público para entidades bancárias

Muitas entidades do setor público negociam, com bancos, a venda da folha de pagamento por um determinado período e consideram tal evento como uma alienação de Ativos com registro em contrapartida de uma Receita de Capital. No caso a visão subjacente e atualmente prevalecente é de a Folha de Pagamento se trata de um “Ativo Intangível”, justificando-se tal roteiro contábil.

A IPSAS 1 – Apresentação das Demonstrações Contábeis; define Ativo da seguinte forma:

Ativos são recursos controlados por uma entidade em conseqüência de eventos passados e dos quais se espera que resultem fluxos de benefícios econômicos futuros ou potencial de serviços para a entidade.

No caso da “Folha de Pagamento” a entidade pública negocia um direito de acesso que na verdade não lhe pertence, pois os servidores detêm o poder final de decisão e podem não aceitar que sua conta bancária onde percebe o salário, passa a ser sediada naquele banco específico. Por outro lado o contrato que é celebrado entre a entidade pública e o banco exime a responsabilidade da entidade pública com eventuais desistências de servidores, passando a ser um risco normal do negócio a ser assumido pelo banco.

A IPSAS 31 – Ativo Intangível define um Intangível da seguinte forma:

Ativo intangível é um ativo não monetário identificável sem substância física.

A essência econômica, para além da forma jurídica em transacionar o volume de acesso de contas bancárias dos servidores para um determinado banco pretende, de fato, viabilizar um fluxo exclusivamente financeiro para a entidade pública.
Por sua vez o banco está motivado em adquirir tal possibilidade acesso porque lhe permite ampliar sua base de clientes e eventuais consumidores de seus produtos e serviços. Uma das características de um Ativo é sua capacidade de gerar um fluxo de benefícios no futuro e, no caso, os contratos se limitam no tempo, motivados exclusivamente por um fluxo financeiro.

Não se vislumbra, no âmbito da IPSAS 31, perspectiva conceitual para considerar a cessão temporária de direito de acesso às contas bancárias de servidores como um Ativo Intangível. Veja-se, por exemplo, que a IPSAS 31 exclui os seguintes tipos de Ativos, não os considerando como um Intangível:

(a) Ativos intangíveis mantidos para venda no curso normal das operações da entidade;
(b) Arrendamentos mercantis;
(c) Ativos decorrentes de benefícios a empregados.
(d) Ativos financeiros.

Se o direito de acesso às contas bancárias dos servidores pode ser
sistematicamente transacionado com um banco, tal situação caracteriza muito mais se tratar de um Instrumento Financeiro, remetendo para uma possibilidade conceitual de Ativo financeiro, justamente porque pode integrar a rotina de venda normal nas operações da entidade pública.

A IPSAS 28 – Instrumentos Financeiros – Apresentação; adota as seguintes
definições:

Instrumento financeiro é qualquer contrato que dê origem a um ativo financeiro para uma entidade e a um passivo financeiro ou instrumento patrimonial para outra entidade.

Ativo financeiro é qualquer ativo que seja:
(a) Caixa;
(b) Instrumento patrimonial de outra entidade;
(c) Direito contratual:
(i) de receber caixa ou outro ativo financeiro de outra entidade; ou
(ii) de troca de ativos financeiros ou passivos financeiros com outra entidade
sob condições potencialmente favoráveis para a entidade;
(d) um contrato que seja ou possa vir a ser liquidado por instrumentos
patrimoniais da própria entidade, e que:
(i) é um não derivativo no qual a entidade é ou pode ser obrigada a receber um número variável de instrumentos patrimoniais da própria entidade; ou
(ii) um derivativo que será ou poderá ser liquidado de outra forma que não pela
troca de montante fixo de caixa ou outro ativo financeiro, por número fixo de instrumentos patrimoniais da própria entidade. Para esse propósito, os
instrumentos patrimoniais da própria entidade não incluem os instrumentos financeiros resgatáveis classificados como instrumentos patrimoniais de acordo com os parágrafos 15 e 16, os instrumentos que imponham a obrigação a uma entidade de entregar à outra parte um pro rata como parte dos ativos líquidos da entidade apenas na liquidação e são classificados como instrumentos patrimoniais de acordo com os parágrafos 17 e 18, ou os instrumentos que são contratos para futuro recebimento ou entrega de instrumentos patrimoniais da entidade.

Nesta perspectiva o contrato de acesso às contas bancárias dos servidores (Folha de Pagamento), caso não imponha co-obrigações outras para a entidade pública, assume a característica de um Ativo Financeiro, porque oriundo de um Instrumento Financeiro detido pela entidade pública, com o único objetivo de propiciar uma entrada de caixa para a entidade pública; descaracterizando-o, portanto, como eventual Ativo Intangível.

Na verdade tais contratos deveriam ser analisados na perspectiva da IPSAS 9 – Receitas de Transações com Contraprestação; que define o seguinte alcance:

Uma entidade que elabora e apresenta suas demonstrações contábeis de acordo com o regime de competência deve adotar esta Norma (IPSAS 9) na contabilização da receita proveniente das seguintes transações e eventos com contraprestação:
(a) Prestação de serviços;
(b) Venda de bens; e
(c) Utilização, por parte de terceiros, de outros ativos da entidade que geram juros, royalties e dividendos.

Devido ao caráter continuado e possibilidade de sucessivos contratos com
entidades bancárias para acesso às contas bancárias dos servidores, os fluxos financeiros advindos dos contratos para a entidade pública, assumem característica de Ativo Financeiro, com contrapartida em uma Receita Corrente, pois traduz um fluxo constante de recursos financeiros, em face de utilização de direito limitado detido pela entidade pública em poder ceder este acesso para terceiros.

Francisco Ribeiro

segunda-feira, 11 de abril de 2011

A importância da gestão da planilha de composição de custos nos contratos administrativos

João Delmiro Bueno Corrêa

O termo gestão da planilha de composição de custos tem sido mal interpretado por muitos que militam na área de Administração Pública. Então, a primeira referência deste texto deve se relacionar com o termo gestão. No caso da planilha de composição de custos, gestão deve ser compreendida como o conjunto integrado e sistêmico de processos que estão envolvidos na decisão de terceirizar, ou seja, engloba desde a tomada de decisão de terceirizar determinado serviço até o encerramento do contrato. Assim, estamos realizando gestão do contrato administrativo quando tomamos a decisão de terceirizar um serviço, planejamento a contratação, elaboramos o Edital de licitação com os respectivos anexos (dentre eles a planilha de composição de custos), analisamos as propostas apresentadas, acompanhamos os contratos, estudamos a possibilidade de prorrogá-los ou encerrá-los. 
É imprescindível que os gestores, funcionários ou servidores públicos envolvidos com os processos de terceirização tenham pleno conhecimento dos componentes da planilha de composição de custos. O conhecimento destes componentes, no que se refere ao conceito e possíveis metodologias de cálculo auxiliam na análise criteriosa dos preços ofertados para os serviços terceirizados. Sem este conhecimento é impossível afirmar se o valor proposto para os serviços será exequível ou inexequível.
Desde a edição da Lei nº 8.666/93 toda a Administração Pública, no âmbito federal, estadual e municipal, bem como no Executivo, Legislativo e Judiciário, direcionaram o julgamento das licitações para o menor preço. Isto é bastante louvável, visto que os agentes públicos executam dinheiro público, ou seja, da sociedade brasileira, por intermédio principalmente da arrecadação de impostos e transferências intergovernamentais.
Deve-se considerar, no entanto, que no caso de serviços terceirizados, quando os contratos administrativos podem ter um prazo de execução mais largo, podendo alcançar até 60 meses e, em casos excepcionais, estender-se para 72 meses, os cuidados na contratação devem ser redobrados e a análise do preço deve levar em consideração o período total possível. Melhor explicando: de nada adianta ter uma proposta de menor preço inicialmente aceita na licitação, se posteriormente a Administração Pública deverá administrar um passivo trabalhista deixado pela empresa contratada que simplesmente desapareceu do cenário de negócios.
Enfatize-se, ainda, que com o advento do pregão, presencial ou eletrônico, há uma tendência das empresas, representadas por profissionais ligados ao comercial, de reduzirem drasticamente seus preços por ocasião dos lances. Posteriormente, por ocasião da readequação da planilha, estas empresas são obrigadas a zerar ou apresentar custos irrisórios para determinados itens da planilha, o que aumenta o risco de o contrato não se finalizar adequadamente.
A compreensão dos itens que compõem a planilha de custos por parte da Administração Pública é condição fundamental para uma análise criteriosa da decisão de contratar. Grande dificuldade enfrentada pelos servidores públicos é com relação ao regime CLT, pouco conhecida dos profissionais que são regidos pelo regime estatutário. Quando falamos, por exemplo, em indenização adicional – um dos componentes da planilha de custos dos serviços terceirizados – poucos conhecem o conceito e metodologias de apuração deste item. Muito do planejamento dos serviços a contratar são elaborados com base em Editais e Minutas de Contrato fornecidas por outras instituições públicas que, muitas vezes, não apresentam as mesmas características e peculiaridades daquela que “copiou” as peças do procedimento licitatório.
Considere-se, ainda, que a compreensão dos diferentes itens que compõem a planilha de custos é necessária nas diferentes fases do processo de contratação, ou seja, no planejamento, no julgamento das propostas, no acompanhamento do contrato e na hora de decidir se vamos prorrogar ou encerrar o contrato. O monitoramento do que acontece no contrato de serviços terceirizados é de fundamental importância para que possamos justificar a sua prorrogação (ou não) em bases econômicas sólidas, demonstrando a economia que podemos ter com a extensão do contrato (ou seu encerramento). Com a intensificação da atividade de controle interno e externo, é imprescindível que o gestor público conte com elementos concretos para demonstrar o acerto de sua decisão e não sofrer questionamento futuros.
De outra parte, deve-se considerar que uma sociedade justa e sustentável é cuidadosa com os direitos dos trabalhadores. Assim, é de se esperar que a Administração Pública exerça o seu papel de maestro na construção desta sociedade. Não se pode admitir que o agente público tome decisões equivocadas e que irá, posteriormente, prejudicar os direitos sagrados do trabalhador, tais como aqueles vinculados à rescisão do contrato de trabalho.
Temos assistido à Administração Pública ser condenada sistematicamente pela Justiça Trabalhista a arcar com os direitos do trabalhador, por ocasião do encerramento dos contratos de terceirização. Considere-se que a relação de terceirização é tripartite, ou seja, envolve o trabalhador, a empresa contratada e o contratante (no caso específico a Administração Pública). Quando a empresa contratada desaparece desta relação e o trabalhador recorre à Justiça para obter ou fazer valer seus direitos, na maioria das vezes os juízes trabalhistas têm entendido que a Administração Pública não fiscalizou adequadamente o contrato, condenando-a a pagar novamente os direitos que já tinha repassado para a empresa contratada.
Decisão do Supremo Tribunal Federal, de novembro de 2010, manifestou-se sobre a constitucionalidade do artigo 71 e seu parágrafo único. No entanto, os ministros afirmaram que o Tribunal Superior do Trabalho não pode generalizar os casos e deve investigar se a Administração Pública fiscalizou adequadamente ou não o contrato. Evidente, então, que o pleno conhecimento dos componentes e metodologias de cálculo da planilha de composição de custos, e a respectiva formação de preços, é condição indispensável para que a Administração Pública exerça com eficiência e eficácia a sua função de fiscal de contratos administrativos.
A legislação brasileira não tem facilitado a tarefa dos agentes públicos que têm a responsabilidade de planejar e acompanhar os contratos de terceirização, uma vez que as mudanças são frequentes. Tomemos como exemplo o Executivo Federal. Há algum tempo o Ministério do Planejamento, Gestão e Orçamento, por intermédio da Secretaria de Logística, tenta disciplinar o assunto dos serviços terceirizados, focando principalmente nos serviços de limpeza e vigilância, que são, sem sombra de dúvida, os contratos que mais impactam nesta instância de governo. A Instrução Normativa nº 02, editada em 2008, já sofreu várias alterações, acréscimo e supressões no seu texto original e ainda não conseguimos um regulamento que possa ser aplicado com racionalidade pela Administração Pública. Mais recentemente a Portaria Normativa nº 04, de 20 de janeiro de 2011, não acrescentou luz sobre o assunto, apenas confundiu o gestor. Acrescente-se a este cipoal de regramentos, as constantes alterações no âmbito da legislação trabalhista, previdenciária e tributária.
A gestão de contratos é uma função rotineira na área pública e a tendência é que cresçam os processos a ela ligados; portanto, é imprescindível nos prepararmos para enfrentar estes desafios, que incluem a planilha de composição de custos.